As Crônicas Marcianas, de Ray Bradbury, é uma deliciosa coletânea de histórias curtas (na verdade está entre uma coletânea de histórias curtas e uma novela episódica, ou nas palavras de Ray Bradbury: “Um livro de histórias que pretende ser uma novela”), que descreve a colonização de Marte por humanos que estão vindo de uma Terra problemática e que está a beira da destruição por uma guerra atômica. Escritas no fim dos anos 40, e publicadas em revistas de ficção científica da época, pode ser considerada uma poética interpretação do futuro que esta além dos limites de qualquer forma tradicional de ficção. A visão de Marte como uma espécie de novo mundo, e dos colonizadores como aventureiros lembra em muito a desbravação do oeste americano. Ray Bradbury mostra um Marte muito parecido com a Terra, o que é coerente com o conhecimento científico da época, com atmosfera respirável – mas rarefeita , fauna e flora semelhantes a terrestre, e até mesmo marcianos parecidos demais com humanos. A civilização marciana é mostrada como muito antiga, e assim como os nativos americanos, fadada a extinção devido a ambição dos colonizadores. Sem dúvida é uma leitura obrigatória não só para apreciadores do gênero, pois Bradbury consegue ser engraçado, nos fazer refletir sobre problemas humanos atemporais, e acima de tudo nos surpreender com sua narrativa envolvente. Selecionei o trecho abaixo:
“… Perdemos nossa fé e o sentido da vida. Se a arte não é mais que sublimação do desejo frustrado, se a religião não passa de auto-ilusão, para que a vida? A fé sempre nos deu respostas para todas as coisas. Mas tudo se perdeu com Freud e Darwin. Fomos e ainda somos um povo extraviado”…
Outro trecho:
Também em Marte o homem tornou-se homem demais e não suficientemente animal. E os marcianos perceberam que, para sobreviver, tinham que desistir para sempre de fazer aquela pergunta: para que viver? A vida é a própria resposta. A vida é a propagação de mais vida e de viver o melhor possível. Os marcianos compreenderam que perguntavam “Para que viver?” no momento culminante de um período de guerra e desespero, quando não havia resposta. Porém, uma vez acalmada, tranqüilizada a civilização, as guerras terminadas, a pergunta tornava-se sem sentido. A vida tornava-se boa e as discussões eram inúteis…
(segue daí uma bela discussão sobre a genialidade ou ingenuidade do modo de vida dos marcianos)
Leitura mais que recomendada, considero obrigatória!